CARTASES CRÔNICAS, DE VÂNIA GOMES
Para entender e “degustar” este livro, tão bem elaborado nas entrelinhas, pela verve criativa da escritora Vânia Gomes, adentrei-me, mais ”demoradamente” no termo, que dá nome ao título. A palavra catarse, que procede da filosofia grega. Autores ilustres, como Aristóteles já falavam sobre esta questão. A catarse se refere à liberação das paixões, ou seja, à expressão dos sentimentos interiores, que causam uma sensação de plena liberdade e pureza.
Lembro-me quando trabalhava na Lopes Royal, o Sr. Wildemir de Martini, que apreciava meus escritos, e, que infelizmente, não se encontra mais entre nós, um dia, quando se aproximava o carnaval, conversando, perguntei: – E aí caríssimo Dr. já liberou a catarse?…Todos os colegas riram e ficaram com aquela cara de espanto, sem entender. Aí, dei um resumo da minha visão/interpretação, versão sobre a palavra “catarse”. E complementei:- há uma época do ano, em que as pessoas normais perdem a noção do “politicamente correto” e literalmente, “liberam a catarse,” fazendo ou representando, travestidos de alergria fora do comum, o que não teriam coragem de fazer, em outras épocas do ano, se não fosse no Carnaval. – Homens se vestem de mulheres e soltam a “franga”!
A crônica, como todos sabem, é um gênero textual caracterizado por textos curtos, de linguagem simples e que retrata os aspectos da vida cotidiana, geralmente com toques de humor ou ironia, como faz nossa cronista no decorrer da obra. O cronista busca inspiração, para os seus textos nos acontecimentos recentes, ou em situações banais do cotidiano e convida o leitor a olhar para o mundo, como ele.
Esse estilo literário começou a se desenvolver no Brasil, em meados do século XIX, juntamente com o nascimento da imprensa no país. Dentre os primeiros cronistas brasileiros estão Machado de Assis e José de Alencar, entre outros. E Quem não se lembra das famosas Crônicas de Nelson Rodrigues? – Se alguém quiser adentrar em acontecimentos do Serviço Público Federal, onde todos os dias aparecem fatos pitorescos, os quais se não fossem registrados, facilmente, se perderiam com o tempo e com as próprias pessoas. Para exemplificar, além deste belo livro, de Crônicas, de Vânia Gomes, sugiro, também, que os colegas conheçam o livro escrito por Meireluce Fernandes e Ana Tapajós, “Vimos e Ouvimos – Contos e Encontros Internacionais”.
Bem, agora, vamos ao que mais nos interessa:
Quando li, o livro: “Catarses Crônicas”, de Vânia Gomes, me vi naqueles corredores, no bate-papo, na copa do cafezinho do IPEA, onde trabalhei por 15 anos e cada Crônica lida aqui me levava de volta ao passado.
Coube a mim, falar sobre as Crônicas: “Herança, Férias no Brasil só para os fortes e – Em Brasília, 19…semanas”.
Na primeira crônica “HERANÇA”, a autora menciona um diálogo interessante com um “hermano argentino”, que tinha um enorme fascínio por Brasília, uma cidade construída do nada. O ‘hermano’ entusiasticamente falou do grande estadista Juscelino Kubitschek de Oliveira e dos seus gloriosos feitos. Mas a cronista teve que desapontá-lo, dizendo que Juscelino, apenas, realizou o sonho de Dom Bosco e aproveitou o projeto dos Patriarcas de transferir a capital do país para o centro do território nacional. Fala de toda a pujança de Brasília, sua arquitetura, o eixo monumental, fonte das grandes decisões nacionais, projetada com amplo espaço, inclusive, para as mais variadas manifestações. Pelo texto, vi que a autora é também apaixonada por esta cidade. Aqui, ela destaca a beleza de um céu azul, e que apesar da sua juventude, já tem identidade própria, onde também surgiram alguns grupos de manifestações culturais, na área da música, como o rock da Legião urbana, Capital inicial e tantos outros, que levaram o nome da Capital para os rincões do Brasil. Brasília é uma cidade multicultural. Aqui, antes, predominava a cultura nordestina, e a Cidade, por ser eclética, engloba tudo:- Sertanejo, Axé, Funk, Zumba, Bossa Nova, MPB, Gospel, Chorinho, etc. Brasília é uma cidade milagre, mas cheia de problemas, como qualquer outra. E por mais de 10 anos funcionou como um milagre, pela incompetência de seus dirigentes. Finalizando, ela cita um trecho do poema de Renato Russo na música “Faroeste Caboclo” e faz coro com João do Santo Cristo: Meu Deus! mas que cidade Lindaaa.
Na segunda Crônica: FÉRIAS NO BRASIL, SÓ PARA OS FORTES. A Autora revela que fazer turismo no Brasil é para poucos. Primeiro pelos aeroportos que têm infraestrutura mínima comparada com os grandes centros internacionais. Fala da experiência do aeroporto de Curitiba, com uma pitada de ironia e sarcasmo. Segundo ela, antes da aterrisagem do voo, a Comissária avisa que a bagagem seria restituída na esteira nº 1. Só tem uma esteira. O Brasil, segundo ela, tem muitos pontos turísticos, mas que carecem de infra estrutura de apoio, ao Turista. O que eu concordo. Isto, sem falar na segurança pública .- Que segurança nós temos?…- Se você for ao Rio de Janeiro não suba os morros sozinho, você pode não voltar vivo. Não é só Rio de Janeiro, há outras capitais que também são violentas, por conta dos homicídios, onde rola solta, a impunidade, principalmente, para “uma trupe de privilegiados”: os Políticos. E que, na grande maioria, o transporte é caótico, caro e ineficiente. Em 2014, houve um acréscimo de um milhão de turistas, mais que em 2013, por conta, é claro, da copa do Mundo. Em se tratando do Turismo é um número pífio e em quase nada se compara com a Espanha, que recebeu 36,3 milhões de Turistas. Por fim, nem tudo está perdido. O Brasil tem um enorme potencial turístico, pelo seu imenso território, e um litoral de 7.367 km banhado pelo Oceano Atlântico. O Governo brasileiro precisa investir, maciçamente, no turismo, pois, ele traz divisas, as divisas geram emprego e renda, e as rendas geram qualidade de vida e benefícios para toda uma população.
Por fim, a terceira e última Crônica: EM BRASÍLIA, 19… SEMANAS. Aqui, a autora nos leva a um passeio pelo bioma, e a aspectos do como é duro viver em Brasília, em uma determinada época do ano. Em clima de introdução, parafreaseando a Voz do Brasil, que diz: Em Brasília, dez(e)nove horas…. e a famosa musiquinha o “Guarani”, de Carlos Gomes. Ela, também, nos leva à reflexão sobre o mês de agosto. Eu creio que foi nessa época que esta crônica foi escrita. Quem mora no DF sabe que nesta estação, a grama marrom, cor de morte, ou quem sabe… adormecida, esperando apenas o “ribombar” dos primeiros trovões, para rejuvenescer, fala com precisão da beleza dos Ipês e das suas flores exuberantes. E, também, da quantidade de pássaros, que nos brindam com as suas sinfonias, nas quadras, entre quadras, nos Lagos Norte, Sul e toda a vastidão do Planalto Central. Talvez, ela, sendo bióloga, fala com tanta naturalidade e conhecimento de causa, amor, de forma apaixonada e até contundente sobre o cerrado, o clima seco, o bioma, as árvores retorcidas, as flores dos ipês e o canto de uma infinidade de pássaros. Aqui, com sua maestria, termina dizendo que escreveu tudo isso, apenas, para dizer aos seus leitores, que a Biologia é uma ciência linda, e a vida é muito mais que um simples milagre. Que sentiu saudade enorme dessa Biologia de campo, e nos brindou com uma verdadeira aula. Obrigado! Vânia. Creio que aprendi um pouco com suas “deliciosas” Catarses Crônicas, simples, mas com uma linguagem didática, direta, e de grande valia, para quem vive os momentos atuais.
PorJosé Carlos Ferreira Brito (cadeira 30) – Letras – Patrono: Castro Alves